Talvez você tenha conhecido Jean-Paul Driot, que morreu neste fim de semana, aos 68 anos de idade, como o dono da equipe da Renault (agora Nissan) na Formula E. Ou então como o fundador da Dams, time pelo qual Sergio Sette Câmara luta por vitórias na temporada 2019 da F2.
Mas o que tornava o dirigente tão diferente no paddock das categorias de base era saber que dinheiro não é tudo.
Antes é preciso explicar que todos os pilotos que competem da F2 para baixo pagam para correr. Todos, sem exceção, precisam desembolsar dinheiro por suas vagas. Alguns, como Mick Schumacher e Anthoine Hubert, contam com o apoio de equipes da F1 para quitar as contas, enquanto outros têm patrocinadores (muitas vezes a empresa da própria família) dispostos a colocar dinheiro neles. Mas de uma maneira ou de outra todos são pagantes.
E quem não consegue o dinheiro necessário para comprar a vaga é obrigado a deixar a carreira de lado e assistir às corridas pela TV.
Tendo fundado a Dams em 1988 e conquistado alguns bons resultados desde então, Driot começou a se dar ao luxo de deixar o dinheiro em segundo plano e escolher seus pilotos pensando só no fator competitivo. Com dois nomes do atual grid da F1 foi assim. Primeiro ele fechou contrato com eles. Só depois é que foi se preocupar como seria pago.
O primeiro desses pilotos foi Romain Grosjean. Em 2009, com 23 anos de idade, o francês foi chamado de última hora pela Renault para substituir Nelsinho Piquet na segunda metade da temporada da F1. Não foi bem. Se envolveu em acidentes e teve o 13º lugar, em Interlagos, como melhor resultado.
Romain Grosjean na Dams
Para o ano seguinte, conforme a investigação do Cingapuragate (quando Nelsinho bateu de propósito para o companheiro Fernando Alonso vencer a corrida) evoluía, a Renault passou por uma reformulação muito grande na F1 — e Grosjean foi demitido.
Como a ida para a F1 tinha sido de última hora, ele não teve tempo de buscar outro lugar no grid. O jeito foi olhar fora da principal categoria do automobilismo mundial, descolando uma vaga para correr pela Ford no Mundial de GT.
Foi quando Driot entrou em cena. No meio de 2010, ele chamou Grosjean para participar de uma das etapas da AutoGP, campeonato concorrente da GP2 (como a F2 era chamada na época), muito mais barato, mas com grid enxuto.
O francês estreou na Dams na terceira rodada dupla daquele ano. Venceu a prova principal. Foi mantido no carro para a quarta etapa. Ganhou de novo. O desempenho foi tão bom que ele conquistou o título com uma rodada de antecipação – e olha que ele só havia estreado no terceiro dos seis rounds.
Driot acreditou no desempenho de Grosjean e o levou à GP2 no ano seguinte. Com alguns patrocinadores, o francês sobrou na pista. Foi campeão com facilidade, com cinco vitórias e quase o dobro da pontuação do segundo colocado, o veterano italiano Luca Filippi, que depois passaria por Indy e Formula E. Com os dois títulos em duas temporadas, Grosjean garantiu a volta à F1, primeiro pela Lotus e depois pela Haas.
O outro exemplo de piloto que teve a carreira salva pelo dirigente francês foi Alexander Albon.
Alex Albon na Dams
Em 2018, o tailandês não tinha o dinheiro necessário para participar da temporada completa da F2. E o jeito foi fechar contrato com a Dams para cada etapa, sem a certeza de que poderia competir na seguinte.
Só que nesse período os resultados foram bons. Albon terminou em quarto na abertura da temporada no Bahrein, venceu no Azerbaijão e largou na pole em Barcelona.
Apesar de o carro da Dams ser cobiçado pelo bom rendimento, Driot manteve a aposta em Albon. O time, então, conseguiu fechar com um novo patrocinador e pôde manter o tailandês até o fim da temporada.
O plano era simples. Se Albon seguisse com o bom desempenho até o fim da temporada, seria promovido para a Formula E, onde seria companheiro de equipe de Sébastien Buemi, na Nissan.
Só que, pouco antes de a nova temporada dos carros elétricos começar, Albon foi sondado pela Red Bull, de onde fora dispensado como piloto júnior alguns anos antes, para uma oportunidade que se abria na Toro Rosso.
Aí estava o dilema. O dinheiro que ele obteria ao correr pela Nissan na Formula E é que seria usado para pagar as contas da Dams, na F2, do ano anterior. Mesmo assim, Albon pediu para ser liberado e se juntar à Toro Rosso. Foi atendido por Driot.
Além de Albon e Grosjean, do atual grid da F1, Kevin Magnussen, Carlos Sainz Jr e Pierre Gasly competiram pela Dams nas categorias de acesso. Assim como Felipe Nasr, que chegou à principal categoria do automobilismo mundial e hoje se dedica à Imsa.
foto do topo: dams/divulgação
